Gastón Acurio

Gastón Acurio

Dos ‘sandubas’ de presunto à cúpula da cozinha ibero-americana

Fotografía: EFE/Paco Chuquiure
Texto: Macarena Soto

Gastón Acurio Jaramillo nasceu em Lima a 30 de outubro de 1967 e logo se decantaria pelos mercados e os postos de comida mais que pelas pistas de futebol da capital peruana. Filho de Jesusa e Gastón, estudou e abandonou a escola de Direito para, primeiro de maneira furtiva, aprender, também da vida, entre fogões.

Começou a mergulhar entre caldeirões ao descobrir que a sua mãe não cozinhava. A partir daí, com sete anos, começou a preparar seus próprios menus e hoje é um dos chefs mais importantes da América Latina. Gastón Acurio, de quem se diz que algum dia poderia ser presidente do Peru, assegura que em outra vida continuaria sendo cozinheiro, mas que também buscaria outro equilíbrio entre vida profissional e vida pessoal.

“Desde criança, tudo o que guardava relação com a cozinha me emocionava de forma diferente a tudo o mais”, rememora Gastón desde sua Lima natal, através de uma conversa por correio eletrônico.

Como um conto, o cozinheiro lembra sua infância, quando ia a um restaurante com sua família “e tudo se enchia de luz e cor” dentro dele: “lembro-me de cada prato, cada instante, de cada detalhe como outros poderão lembrar do primeiro amor de verão”.

Fala com paixão das visitas ao mercado com sua mãe, quando a conversa dela com a senhora do posto de verduras “era como música para os ouvidos”; confessa alegre que preferia “mil vezes” usar o dinheiro que lhe davam seus pais “em um frango assado do que em guloseimas”, e que sua bicicleta “não o levava à quadra de futebol senão ao boteco de ‘sandubas’ de presunto”.

Com 40 restaurantes de comida peruana em 12 diferentes países, Acurio diz que a comida significou “uma oportunidade para romper com uma imagem errada de um Peru conhecido somente por suas matérias-primas ou pelo seu fascinante patrimônio arqueológico”.

OUTROS PERU: A SOCIEDADE MULTICULTURAL DO MUNDO

“É contar ao mundo que o Peru é a sociedade mais multicultural do planeta, que na cozinha pudemos demonstrar ao mundo o que podemos fazer os seres humanos quando celebramos nossas diferenças sem temor e convertemo-las em algo novo e único onde todos se sentem representados”.

Considera que, além do mais, a cozinha é um valor acrescentado para o turismo peruano, que serve para promover os produtos nacionais e “o talento peruano para com o mundo”, aproximando “os peruanos em um sentido de orgulho e segurança no que lhe é próprio”.

Muito antes de ser nomeado empresário do ano em 2005 pela revista América Economia, Acurio, convencido por sua família do “absurdo sonho de ser cozinheiro”, começou em Madri os estudos de Direito, que não demoraria em abandonar para se dedicar à sua grande paixão.

“Vou para Madri, para me converter no pior e mais triste advogado da história”, começa, para explicar que “uma tarde depois de três anos de sofrimento” armou-se “de coragem” e deixou a faculdade com a correspondente matrícula em uma escola de hotelaria na que se convenceu de ser cozinheiro.

Demoraria dois anos em confessar “o delito” aos seus pais, para transmitir-lhes que já formava parte da “profissão mais bonita do mundo”, segundo assegura orgulhoso, porque “consiste em fazer felizes as demais pessoas com o que a gente faz”.

Só questiona seu amor à cozinha quando fala de sua vida pessoal, momento no qual reconhece que sente falta de “outro equilíbrio” em sua vida, porque “chega a família e a gente deve decidir o qué é mais importante”. “O cozinheiro apaixonado costuma acreditar que primeiro é a cozinha e depois a família. Não é assim, primeiro é a família e depois a cozinha”, diz.

O PODER DE COZINHA

Consciente do poder que a cozinha tem a nível mundial e o peso que ganharam os chefs no imaginário coletivo durante os últimos anos, opina que outorgando-lhe valor a “América Latina tem tudo para ser a região mais sedutora do mundo”.
“A gastronomia é uma mostra de uma região rica e criadora que tem em sua cozinha argumentos para conseguir esse objetivo: as cozinhas da América Latina seduzindo o mundo”, apostila.

Acurio, limenho por nascimento e residência, passou parte de sua juventude na Espanha e acredita que a “América Latina e a Península Ibérica devem estar unidas por sempre ” e que, para isso, “devemos começar a definir uma agenda de maneira que nos ajudemos mutuamente ali e quando nos necessitemos por diferentes motivos”.

“O êxito da América Latina é o crescimento da Espanha e vice-versa”, sublinha para exemplificar que “hoje o Peru recebe milhares de jovens espanhóis que vêm a esta terra em busca de um futuro” tal como fizeram em seu momento seus compatriotas “quando no Peru não havia as oportunidades que há hoje”.

A esse respeito, assegura que estes são recebidos “sempre com os braços abertos” e insiste em que “no futuro, as barreiras entre a Península e América Latina, para que uns ou outros possam ir e vir devem ser derrubadas”: “entre amigos, aliados e irmãos não deve haver barreiras, só abraços”, conclui.

IBERO-AMÉRICA PRÓSPERA E TALENTOSO

Sobre a relação entre ambas as partes da Ibero-América –América Latina e a Península Ibérica-, aponta que a Latino-América já não quer “ser outra” nem “aceitar um destino fatal” nem “negar” sua identidade por não ter oportunidades”.

Segundo Acurio, os latino-americanos “já não sonham em ir para a Europa” e hoje sabem que é possível “construir uma Ibero-América próspera para todos e o que deve-se fazer é recuperar a confiança no futuro mais que assegurarmos o dia-a-dia com o medo à fatalidade de maus governos”.

“Quando recuperemos este sentimento coletivo de lutar por um ideal comum em cada ação diária em nossa vida cotidiana, então não nos parará ninguém”, adianta esperançoso em que chegue o momento no qual os “talentos encontrarão sua oportunidade”.